quarta-feira, junho 16

ali, ao lado do cinema

     Sentia o peso em suas panturrilhas enquanto encarava o chão meio tridimensional, pensou ela, cubos vistos de cima.Depois de tentar equilibrar o papel na montanha quatro vezes, na quinta cedeu, resolvendo permanecer no topo.
     Corredor apertado. Espera a vez de molhar as mãos. O da frente olha de soslaio e diz um assustado:
     "Boa noite!"
     "Boa noite", responde.
     "Me deu um susto."
     Ri. Lava as mãos e volta para a mesa. A outra, a do chapéu, levanta e vai em direção ao corredor estreito. A que ficou acende um cigarro e aguarda.
     "Boa noite."
     Sabia, pensa ela, esses conquistadores estão por toda parte.
     Depois de um posso me juntar e a fajuta desculpa do amigo que segundos depois aparece pedindo fogo. Dar uma chance dar uma chance dar uma chance.
     A próxima hora as duas passaram ouvindo sobre Paris e música. Deram poucas palavras, completando aqui e ali. Ah, até que são legais. E quando viu era meia noite.
     Começou a, responsavelmente, pensar na manhã seguinte que chegaria. A fábrica começaria a buzinar, era dia de jogo.
     "O amanhã chega hoje."
     E se despediram. Elas, cada uma dando o telefone para um. Não pediram os deles. E só na manhã seguinte, enquanto o trânsito contornava a sua cama, percebeu: aquela dupla de sambistas não ouviu uma sequer palavra de nossas bocas. O cantor só encarou a do chapéu, falava olhando diretamente para ela e, como era o que mais falava me fez sentir só. Só pegou o telefone dela. E o do pandeiro somente o meu.
     Ela, que sempre fugiu de obviedades, achou/os previsíveis. Olhou para o violão com lenço no pescoço e decidiu tomar uma segunda xícara de café.
     Não pode me fazer mal, pensou.

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