segunda-feira, fevereiro 23

Sentimento Oculto

Suas pintas. Suas pintas.
Desejava vê-las mais uma vez, elas ainda estão aí?
Em seu devido lugar.
Saudade das suas pintas...

sexta-feira, fevereiro 20

Um Porém Dois

Perdoe meus lábios
Busco um prazer infinito
E você está em minha frente

Sentir seu cheiro irá me levar de volta prá 'quela época?
Ver o mesmo programa
Sorrir das mesmas piadas
Abraçar as mesmas causas

Sinto uma dormência revolucionária em meu sangue
Do imenso que é viver
Abrir minhas companheiras pernas
E fazer com que você saiba
Vocês, vocês saibam
É só um, porém dois

"Mas lembrar-se com saudades é como se despedir de novo"

vontade de pôr reticências.

sábado, fevereiro 14

Cabra Cega

A mãe amarra um lenço amarelo em volta dos olhos da criança.
- Vamos brincar de cabra cega. – diz ela.
As duas saem de casa e descem, calmamente, seu caminho. Há pessoas em volta, o chão está molhado. A criança sente que está pisando em algo líquido e tenta tirar a venda. A mãe a impede.
- Mãe, não quero mais brincar. Não quero mais.
- Não minha filha, a gente ainda está brincando...
- Mas não quero mais.
A mãe deixa o laço mais apertado. A leoa segura sua cria com mãos fortes, respiração pesada, carregando o peso da visão no coração. Ela anda mais rápido, e a criança corre para conseguir acompanhá-la. Ela ouve pessoas em volta chorando, outras gritando. Ela também segura um choro. Não chora, pois sabe que a mãe brigaria com ela. Ela continua a sentir algo líquido, viscoso e quente em seus sapatos brancos. Vontade de tirar a venda. Ver o que se encontra em volta dela. Por que elas estavam brincando daquilo?
Quando sente que pararam de descer, ela se acalma. A mãe abaixa, lhe dá um abraço e retira sua venda. A luz do sol cega seus olhos, e com uma careta pergunta à mãe quem havia ganho a brincadeira.
- Você, é claro.
Sorri. Olha para seus sapatinhos brancos e percebe que eles mudaram de cor. Naquele dia, seus sapatos seriam vermelhos.

segunda-feira, fevereiro 9

Moça Com Brinco de Plástico (final)

- Minha buceta fala francês.
Bernardo incrédulo riu.
- Quel est donc ce lien entre nous, cette chose indéfinissable? Où vont ces destins qui se nouent, pour nous rendre inséparables ?
- Wow, nem eu sei falar francês direito! Tive que burlar meu currículo para ser aceito na empresa de advocacia que trabalho. Pode me dizer o que disse?
- O que é então essa ligação entre nós, essa coisa inexplicável? Aonde vão esses destinos que se amarram para nos deixar inseparáveis?
Ficou sem palavras.
Fizeram amor mais uma vez.


Era segunda-feira, o Homem do Fusca Vermelho apareceu novamente. Chamou por ela. Nós sabemos quem é ela.
Ela foi. No mesmo lugar da última vez fez a mesma coisa da última vez. Quando ela estava terminando ele pediu que ela o chupasse, ela disse:
- Não fui paga pra isso.
- Ah, vai. Te pago mais dez reais. Ou vinte.
Eram quatro horas da manhã, estava no fim do seu expediente, Ela só queria ir pra casa descansar, estava exausta, precisava deitar... Precisava comer melancia... Precisava...
- Acorda sua vaca! – gritava o Homem do Fusca Vermelho.
Aos poucos Ela abriu os olhos, seu rosto ardia.
- Não começa a passar mal no meu carro, não tenho nada a ver com isso. Puta fraca do caralho! Não sabe nem chupar um pau direito! Vai, sai daqui! Sai do meu carro!
Empurrou Ela pra fora e foi embora. Ela levantou e voltou pra Praça XV, apenas Marina estava lá.
- Que marcas são essas no seu rosto?
- Que? – Ah, por isso ardia.
- Você deixou te baterem?
- Eu... Eu desmaiei.
- Vamos pra casa.

- Estou grávida.
- O que?
- Grávida.
- Mas... E é meu?
- Tem que ser. Uso camisinha com os outros, você é o único que já aconteceu sem...
- Mas... Pode ter estourado.
- Acho bem difícil, eu sempre verifico quando eles jogam no chão da rua ao final de... Você sabe.
- O que faremos?
- Não sei... Não sei.
Ficaram em silêncio por um tempo.
- Quero ter esse bebê com você. – disse Bernardo.
- Eu também quero.


Quinta-feira, duas horas da madrugada, praça XV.
- Marina, vim só te avisar, eu estou indo.
- Mas agora?
- É.
Um fusca vermelho parou ali, chamou por ela. Sabemos quem é ela. Ela foi até lá e disse que não fazia mais aquilo.
- Puta não deixa de ser puta. Deixa de ser metida. Vem me dar essa bucetinha vem.
O cheiro de álcool vindo da boca dele era forte o suficiente para saber que estava elevado. Ela virou as costas, o homem urrou:
- Volta aqui agora sua puta! Eu to mandando! – levantou uma arma, de maneira que só ficava visível para Ela. Sem escolha, entrou no carro.
- Não faço mais nada disso, é sério. Parei.
- E vai viver como otária?
Foram no lugar de sempre. Lá, com a arma apontada para sua cabeça, ele a obrigou a fazer o mesmo de sempre. Ela negou. Não faria mais aquilo carregando seu futuro filho.
- Quer morrer então, é?! – Um tiro é ouvido do cais.
Uma fina linha de sangue escorreu passando pela Avenida Perimetral, entrando na Rua do Ouvidor, girando à esquerda na Primeiro de Março, chegou à Avenida Presidente Antônio Carlos, virou na Rua Santa Luzia, chegando finalmente à Avenida Rio Branco, quando parou na Cinelândia.
A maquiagem estava borrada, continuava com o corpo aparentemente usado do jeito que sempre fora. Um motor de fusca é ouvido do cais. Agora ia ficar tudo bem, os homens de branco estavam chegando.

Meu casulo de fumaça.

Lembro do cheiro daquela época. Um cheiro frio, triste, porém doce. Só ouvia aquela do cabelo para o alto. Me afogava e nadava por suas melodias e letras sobre relacionamentos que terminaram mal. Me identificava tanto com ela... Era a única que realmente me entendia. Ficava durante horas deitada em minha cama escrevendo poemas rimados em meu laptop enquanto ouvia (e sentia) o choro preso em sua voz, sentindo aquele cheiro... Cheiro de abandono, de toda a tristeza presente nas ruas e apartamentos me envolvendo. Algo incontrolável, odor assassino que se impregnava por minhas roupas. Ao estudar antigas matérias, vi páginas molhadas e letras ilegíveis. As páginas da minha vida se desfaziam em lágrimas e em poucos e raros abraços sinceros. Se alguém me dissesse que pulando de um prédio, ou bebendo tal drink, ou deixar de comer fosse melhorar o que eu estava sentindo, eu faria. E fiz. Desejava que minhas retinas impedissem o inevitável e que minhas pupilas dilatassem até doer. Queria meus cílios secos.

Tenho bebido essas lágrimas por tanto tempo, tudo que restou foi o gosto de sal em meus lábios.

quarta-feira, fevereiro 4

in the elevator

Eram quatro da manhã e ela estava entediada. Sua meia calça de girafas se encontrava rasgada, brincava com o rasgo. A tevê passava algo educativo a qual ela não se interessava. As garrafas a sua volta estavam todas vazias. Os papéis de alumínio jogados a um canto. Seus loiros cabelos encontravam-se bagunçados e oleosos, jogados em seu rosto.
Ela bate a porta do quarto e segue o corredor amarelo com carpete vermelho. Aperta o botão e aguarda o elevador. Entra. Ele sobe, suspira. Queria um cigarro.
O elevador se abre no décimo andar, e ali se encontra um garoto. Olhava para baixo, distraído. Sobe o olhar e se depara com ela, belamente arrasada. Ela esboça um sorriso, e os olhos azuis se fixam nela.
Silêncio.
- Ainda não te vi por aqui.
Ela o olha. Dá de ombros.
- Está hospedada há muito tempo?
- Talvez. - Ela morde os lábios.
- Sua meia está rasgada. Como aconteceu?
- Por que quer saber?
- Não precisa me contar, se não quiser.
Ela não fala nada. Suspira.
- Não lembro.
Ele levanta as sobrancelhas.
O elevador pára no quinto andar. Entra uma enorme mulher vestida toda de dourado e começa a puxar assunto em uma língua que nenhum dos dois reconhece. A estrangeira não pára de falar e ele apenas acena a cabeça. Nem isso ela faz, simplesmente a ignora. Será que seria tão difícil conseguir um cigarro?
A mulher diz algo que parece ser uma despedida e desce no segundo andar.
O garoto dos olhos azuis balança a cabeça e tira a franja de seu liso e escuro cabelo da frente de seus olhos.
Ele a olha.
Ela o olha.
Os dois encaram o chão.
Ela o olha.
Ele a olha.
O botão de emergência é apertado e os dois começam a se beijar. Ela segura com as duas mãos em seu pescoço e o acaricia. Ele desce com sua mão pelas costas magras. O abraço fica mais apertado. O botão do jeans da calça dele machuca o ventre dela. Ela, delicadamente, tira uma das mãos do pescoço dele e desabotoa o botão. Ele estremece. Ela levanta sua blusa verde e a tira com facilidade e rapidez. Ele faz o mesmo com sua blusa roxa. Os cordões dela causam uma certa dificuldade, mas ficam bem entre seu sutiã de bolinhas rosas e azuis. Ele a empurra contra a parede forrada por um papel de parede vermelho e levanta sua saia rodada amarela, ela se segura nele com suas pernas e abaixa o zíper. Ele a ajuda com a meia calça de girafas e em pouco tempo já está dentro dela. A devorando literalmente. Ela morde sua orelha enquanto respira profundamente em seus ouvidos. Ele segura com força suas finas pernas e se movimenta para cima e para baixo, algumas vezes mais rápido, outras mais lento. A respiração dos dois fica mais rápida e densa, a rapidez do movimento se acelera, a mão dela escorrega pelo corpo suado do outro, os dois se grudam por alguns segundos, sem movimento algum, simplesmente paralizados, sem respirarem. E então respiram, um profundo respiro. Se soltam calmamente e começam a se vestir, ainda respirando com dificuldade.
O botão de emergência é apertado novamente. O elevador se move.
Pára no térreo, os dois saem.

segunda-feira, fevereiro 2

Volta às aulas!

Fazia mágica com minhas mãos
A música psicodélica ao fundo só ajudava
Dando o empurrão que faltava
Pensava também num futuro presente:

em que ao descer a rua olharia sempre para trás
só para ver o sol ainda nascendo
e você, de braços abertos,
o recebendo com uma luz rosada
sua montanha se aquecerá
mas nesse momento já estarei sentada encarando o branco
talvez não tão cega quanto aqueles da cidade desconhecida tão conhecida...

E então se tornará uma rotina, pior do que qualquer outra
E chegará um momento em que talvez não olhe mais para você,
nem para o que o cobre
E nesse dia, estarei morta.
Como muitos já estão.

Minha vida se desfaz em páginas.

Todos os presentes estão preenchidos por certezas e incertezas. Transbordam com suas certezas, fazem um colchão, algo que protege do limo da pedra molhada. Pedra que respira. Como suas incertezas transpiram! O suor é a alma. Alma que todos escolhem adotar. Mas alma não se adota, nem se escolhe. Simplesmente se tem. E com ela se faz, se é.

Meus pés estão frios, tão frios que nem os sorrisos a minha volta conseguem esquentá-los. Gosto de sentir esse frio. Mostra que eles estão vivos, que me levam para todo lugar. Não desejo fogo para aquecê-los. Nem mãos para envolvê-los. Desejo mãos em meus cabelos. Que desenbaracem minhas incertezas. Meus vestidos já se encontram em cabides, porém as incertezas continuam aqui. Certas por serem incertas.

Fui ao inferno e trouxe essa camisa para você.

Hoje experimentei sentir tudo de novo. Um choro desesperado me alcançou como há muito não fazia. Lembranças com realidade fez machucado. Mas não sangrei literalmente. Nem me embebedei ou usei qualquer tipo de drogas. Apenas um cigarro serviu. Talvez um abraço dele ajudaria. É só um abraço, sabe? Um pedido de ajuda e conforto, algo acessível. Significaria muito mais do que um beijo. Não quero mais beijos dele.
Eu te conheço toda por te viver toda.


Que há entre nunca e sempre que os liga tão indiretamente e intimamente?

Oi, prazer.

Estava eu aguardando para receber meu humilde salário quando uma mulher ao lado puxou assunto. Tivemos uma conversa agradável e chegou a pergunta do que eu faria na faculdade. Disse que ainda não sabia, mas que estava pensando em cinema. A mulher, que me conhecia há apenas 10 minutos, disse que tinha mesmo a ver comigo. Eu ri e concordei. Olhei para como eu estava vestida. Um vestido tomara-que-caia curto e rodado rosa xadrez, sapatilhas roxas, bolsa de brechó e duas tatuagens.
Será que sou tão previsível assim?