sábado, setembro 6

Cherry.

Chego no colégio, e os poucos que sabiam já vinham me perguntando: é hoje? É hoje? Sim, é hoje.
Estava nervosa e ao mesmo tempo feliz. Não, não era felicidade. Era algo que nunca havia sentido antes. A tatuagem havia se tornado meu maior objetivo.
Foi algo difícil. Ninguém entendeu. Acho que ainda não entenderam, mas não tem problema. Sou eu que tenho que entender. Eu que a carregarei pelo resto de minha vida.
Meu pai disse:
- um dia eu estou com vontade de ir à índia, no dia seguinte não estou mais.
- pai, eu sou do tipo de pessoa que vai à índia.
Acho que o único jeito de viver e aprender com isso é fazendo o que se deseja. Claro, todos fizeram certo em me alertar e em ficar preocupados. Afinal, isso só mostrou mais o quanto se importam comigo e com minha felicidade futura. E mais ainda, com minha felicidade momentânea, já que muitos contribuíram.
Ao ter certeza que tal desenho sempre terá significado para mim, mesmo que eu, mais do que o meu corpo, esteja em constante mudança, nada mais importa.
Hoje, minha pin up tem uns 13 significados, amanhã terá 14 e daqui a trinta anos terá 20 ou apenas 2. Mas sempre o terá.

Ao chegar no estúdio, cumprimentei todos e disse que meus pais já estariam chegando para autorizar o início. Sim, 16 anos.
Quando a agulha tocou minha pele, fiz uma cara de: ai. Mas aos poucos fui acostumando com a nova sensação, algo que nunca havia sentido, era tipo um choque fraquinho. Vi que seria mais fácil do que pensava. Com uma mão embaixo da perna e a outra fechada com tanta força que ficou marca das minhas unhas e suando como nunca havia suado, fiz a tatuagem. Além de ser agradável, tive a presença de quatro amigos, dos dois pais e até do meu avô. Cada um passou por lá durante algumas das quatro horas e meia em que me deixava na mão de um homenzarrão todo tatuado e cheio de piadas.
Ao término, pensei: ainda quero muitas dessas.
O espelho se tornou um bom amigo e ao mesmo tempo o pior. Estou me esforçando para não ficar admirando-a a todo segundo.
E ouvindo uma música hoje, chamada Cherry, me dei conta:
‘Her name is Cherry, we’ve just met, but already she knows me better than you. And when I’m lonely, Cherry is there, and she plays along while I sing out my blues. So I got me a new best friend, and Cherry is her name.’
E agora, tenho uma felicidade interna (e externa).

Afinal, fui à Índia.

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